sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

O Polícia



Imagem do site dinheirovivo.pt

O polícia é um tipo alto e encorpado, moreno, com um sorriso capaz de derreter qualquer mulher. É minhoto, e mantém o sotaque com muito orgulho. Trabalha na esquadra do Bairro Alto há vários anos, e de há uns meses para cá tem trabalhado à paisana. “Mas toda a gente sabe quem vocês são”, digo eu, a meter-me com ele. “Não sei se serve de muito andarem por aí a fingir que são civis”. Ele ri-se. “A nossa missão também passa pela prevenção”.

 É uma esquadra onde não há muito tempo morto. Drogas, furtos e rixas são o prato do dia, especialmente ao fim-de-semana. Penso nos seus parcos ordenados.

“Admiro o que vocês fazem, por tão pouco. Deve ser preciso gostar muito.”

“Há polícias que o são pelos benefícios. Por ser uma segurança, por ser um ordenado certo. Mas nesta esquadra gostamos mesmo do que fazemos, e há um grande espírito de camaradagem.”

 A prova disso foi a baixa que 35 polícias dessa esquadra puseram no dia 14 de Julho, como forma de protesto a uma condenação de dois colegas, por alegada agressão a um estudante alemão. Toda a esquadra manifestou a sua solidariedade – e antes que hajam comentários/emails a reclamar que baixa não é protesto, a verdade é que a PSP, ao contrário de todas as outras classes de funcionários públicos, não pode manifestar-se ou fazer greve, e sim, esse dia de baixa tem o devido desconto no ordenado.

 É sexta-feira e estamos num bar espaçoso, na Rua da Barroca, decorado em tons de castanho, onde há um espaço com mesas e bancos e uma pista de dança. Está a dar uma música de Michael Teló e há dezenas de pessoas a dançar, animadas. “O que é que andam aqui a fazer? Não se passa nada”. O local está cheio de paisanas, e também já passaram por aqui alguns polícias fardados. Nos últimos meses, é frequente vê-los por ali. “Têm havido pequenos furtos.” Bebe-se um shot de Jack Daniel’s. “O que prova que nem toda a gente sabe quem somos”, remata.

 Na verdade, estou mal informada. Uma pesquisa rápida no Google traz-me a notícia de uma agressão a quatro polícias de folga, por nove homens, naquele mesmo bar, em Janeiro.

 Não é raro ver estes anjos da guarda pelos bares, quando não estão a trabalhar. É comum vê-los a dançar, beber copos ou ouvir um fado, um pouco por todo o bairro. Gostam do que fazem, mas têm também um amor muito especial à comunidade em que se inserem.

 Sendo ele amigo de muitos trabalhadores e comerciantes da zona, perguntei-lhe se alguma vez teve que deter alguém de quem gostasse, ou se alguma vez deixou de o fazer. “Apenas uma vez”, afirmou. “O porteiro de um bar, que é quase como um pai para mim. Envolveu-se numa rixa com alguém que estava a causar distúrbios. Acabei por não os deter.”

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

World Music no Bairro Alto



Música ao vivo em bares e restaurantes é uma tendência crescente, e o Bairro Alto, rei da noite por excelência, está cheio de artistas que vale a pena ter em atenção.
Estes são alguns dos artistas que se têm destacado pelo seu talento e trabalho – procurem-nos quando forem beber uns copos.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

19 horas, Rua do Norte

 A malta gira do restaurante Sul fuma um cigarro à porta, impecáveis nos seus aventais verdes, antes de começar o movimento. Gosto do cabelo loiro-afro-louco de um deles e do ar sempre descontraído da morena. Abstenho-me de olhar muito para a El Dorado, passo a vida apaixonada pelos sapatos que vão aparecendo na montra, se entrasse era bem capaz de perder a cabeça e gastar um ordenado inteiro de uma vez. Mais à frente, na loja Baco Alto, sou sempre recebida pelo senhor de cabelos grisalhos com um sorriso simpático. Sabe a marca de tabaco que fumo e os vinhos que gosto (Alentejo, sempre), tenho a agradecer-lhe a descoberta do Arte Real e do Montaria – companhia cool para serões à conversa com os amigos – e os rebuçados Flocos de Neve que roubo sempre do cestinho. Olho para dentro do bar Soft, na porta ao lado, e sinto umas súbitas saudades de noites de Verão agradáveis a beber martinis com um amigo que se mudou para Barcelona. Passo pelo angariador de clientes do Restaurante Camões, nos seus óculos de aro fino e boina à marialva, sempre em cima dos turistas para os pôr a ouvir fado. Na Tasca dos Canários bebo café ao som d’O Preço Certo, e encontra-se sempre alguém conhecido ou alguma paixão antiga para dois dedos de conversa. Observo discretamente a malta hipster a falar de bandas indie e a beber imperiais, poetas com barba de muitos dias a escrevinhar nos seus moleskines e os ciganos que vendem caldo Knorr aos turistas, que aparecem para uma imperial antes de atacar as ruas. À porta da Bad Bones está o tatuador charmoso de cabelo branco e olhos claros, com uma t-shirt em tons néon, com quem troco um “boa noite” e um aceno, ou a miúda da recepção com os lábios impecavelmente pintados de vermelho e ar de pin-up. Espreito o Grapes & Bites para ver quem está a tocar, as luzes baixas, as pipas de vinho e o som ecléctico e de qualidade (rock clássico, ritmos africanos, jazz) fazem-me sempre pensar que tenho que lá ir um dia destes, mas fica sempre para amanhã. A Adega Machado continua em obras, nunca lá fui e morro de curiosidade, mas todos dizem que nunca mais será a mesma coisa. Olhando para dentro do Nelson, tasca típica à moda antiga, vejo os pratos bem aviados a sair com rapidez e eficiência, enquanto que ao balcão se juntam guitarristas e violistas de fado a beber café. Mais à frente, o rapaz moreno de cabelo comprido abre o Bali Bar e a malta do Cohiba gira por todo o lado a fazer os preparativos para a noite. Do Alface Hall vem a voz de Jerry Lee Lewis ou blues bem velhinhos, à porta há sempre viajantes do hostel a beber imperiais, a fumar cigarros e a observar quem passa com olhos de quem vê tudo pela primeira vez e se prepara para uma noite (muito) bem regada. A angariadora de clientes do restaurante indiano, também ela indiana, ilumina-me o início da noite – as roupas brilhantes e o sorriso rasgado dão-lhe o ar de ser a mulher mais feliz do mundo.