sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Sr. Porco, o merceeiro

 O velho merceeiro é um homem de cabelos grisalhos e óculos de armação redonda e dourada, que tem servido várias gerações de donas de casa e estudantes de dança e música. Tem o ar rabugento de quem vive com poucos luxos, mas de vez em quando rasga um sorriso franco. Detesta que lhe peçam sacos de plástico com asas para levar poucas coisas – mas é capaz de conceder fiado aos clientes mais regulares.

 Tem na sua mercearia tudo o que corresponde às necessidades dos seus clientes: gomas para os mais novos, bolachas de água e sal para as bailarinas que querem manter a linha, coca-cola que os rapazes adolescentes bebem como água, bolachas de chocolate que os músicos mordiscam durante as longas horas de estudo, alguns legumes frescos para o almoço das idosas da zona.

 É o sítio onde muitas crianças roubam, pela primeira vez, uma pastilha elástica ou um chocolate. É conhecido entre elas como Sr. Porco – as mãos sujas tanto pegam em moedas como em gomas, sem nunca serem lavadas. Fornece os primeiros cigarros a muitos pré-adolescentes imberbes com a sensação de estarem, pela primeira vez, longe da asa protectora dos pais – assim como muitas garrafinhas de Smirnoff, que são bebidas às escondidas nas casas de banho. E são estes pequenos luxos e rebeldias de várias gerações de crianças e adolescentes que permitem ao filho do merceeiro uma forma bem mais glamourosa de usar as mãos: nas teclas de um computador em CAD, a cortar k-line para uma maquete, a desenhar nas folhas de um moleskine.

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